Mais um escândalo de corrupção é deflagrado na Saúde colocando na mira gigantes do setor. A Operação Ressonância, etapa da Lava Jato que mirou em contratos para a aquisição de equipamentos do Rio, foi deflagrada ontem (4/7) e mostrou que licitações foram fraudadas para a compra de itens em quantidade desnecessária e que outros equipamentos foram pagos e sequer foram entregues às unidades de saúde.
A operação foi desencadeada pelo MPF, em conjunto com o Conselho de Defesa Administrativa (Cade), o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria Geral da União (CGU), a Receita Federal e a Polícia Federal, com o objetivo de aprofundar as investigações sobre aquisições na área da saúde firmados pelo governo do Estado e pelo Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad (Into).
O esquema de cartel vem desde 1996, de acordo com o Ministério Público Federal, durante a gestão do governador Sérgio Cabral (MBD) e permanece vigorando até hoje.
O escândalo de corrupção começou em abril de 2017 com a Operação Fatura Exposta, que na época prendeu Sérgio Côrtes, ex-diretor do Into, ex-secretário de Saúde de Cabral e estreito colaborador do emedebista. Ele foi solto em fevereiro deste ano pelo Supremo Tribunal Federal (só precisa permanecer em casa no período noturno). Hoje, sua residência foi alvo de mandado de busca e apreensão, mas ele não foi encontrado em casa. Côrtes teria ido realizar uma cirurgia e saiu antes das 6 horas, de acordo com o MPF.
O TCU e a CGU analisaram processos licitatórios selecionados aleatoriamente, e encontraram as mesmas irregularidades neles, o que comprovaria a persistência do modelo criminoso. O TCU avaliou nove pregões, num total de R$ 180 milhões, e detectou “possível débito” de R$ 85 milhões. O valor se refere a equipamentos que não tiveram a entrega comprovada. O órgão pediu que as entregas sejam atestadas por meio de documentação e fotos e ainda aguarda respostas.
No Into, foram localizadas mais mesas cirúrgicas do que quartos disponíveis para a realização de cirurgias. Isso foi detectado numa vistoria in loco da CGU, realizada no segundo semestre do ano passado.
“Foram encontrados equipamentos de alta complexidade sem uso. Isso permite visualizar como a corrupção afeta as escolhas públicas e prejudica diretamente a população”, disse a procuradora da República Marisa Ferrari, ao detalhar a operação.
Conforme o MPF, a liderança do cartel era exercida pela empresa Oscar Iskin, do empresário Miguel Iskin, e outras 33, pelo menos, também participavam do esquema (parte delas, laranjas). Elas formavam o “clube do pregão internacional”. Licitações foram feitas no exterior sem que fossem divulgadas, de modo a impedir a entrada de empresas de fora do “clube”. Eram feitas exigências excessivas, outra forma de afastar outras possíveis interessadas. As listas dessas exigências eram redigidas pelo próprio “clube”, e assinadas por funcionários públicos.
De acordo com o MPF, a propina era de 40% do valor dos contratos. Houve compras fraudadas inclusive para serem entregues em outros Estados brasileiros, uma vez que o Into é referência nacional para cirurgias ortopédicas e se relaciona com o Sistema Único de Saúde.
As empresas que não faziam parte do cartel eram desclassificadas no decorrer de diferentes etapas dos pregões, explicaram procuradores da República.
Foram decretadas pela 7ª Vara Federal Criminal as prisões preventivas de 13 pessoas e temporárias de nove, e também busca e apreensão de possíveis provas em 44 endereços. Apenas duas prisões não foram efetuadas, porque os alvos não estavam no País. O bloqueio de bens dos investigados chegou ao valor de R$ 1,2 bilhão.
“Esse grupo agia desde a fase de publicação de editais, colocando especificações técnicas que só poderiam ser atendidas pelo cartel, depois na fase de lances, e também fornecendo subsídios para tornar o jogo de cartas marcadas. Temos indícios suficientes para dizer que ainda hoje dentro do Into há cobrança de propina. As trocas na direção foram feitas para perpetuar o esquema. O prejuízo é inestimável”, afirmou o procurador Felipe Bogado.
Entre os envolvidos, há executivos de empresas multinacionais fornecedoras de insumos médicos, como Philips, Johnson & Johnson, Drager, Stryker.
Defesas
Philips
A Philips informa que ainda não teve acesso ao processo, no entanto, está cooperando com as autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos quanto às alegações apresentadas, que datam de muitos anos atrás. Os atuais líderes executivos da Philips não são parte da ação da Polícia Federal; um colaborador da equipe de vendas da Philips foi conduzido para prestar esclarecimentos. A política da Philips é realizar negócios de acordo com todas as leis, regras e regulamentos aplicáveis. Quaisquer investigações sobre possíveis violações dessas leis são tratadas muito seriamente pela empresa.
Johnson & Johnson Medical Devices Brasil
A empresa afirma que “segue rigorosamente as leis do país e está colaborando integralmente com as investigações em andamento”.
GE
“A respeito da operação da Polícia Federal conduzida na manhã de hoje, que resultou na prisão temporária de Daurio Speranzini Jr., esclarecemos que as alegações são referentes ao período em que o executivo atuou na liderança de outra empresa. A GE ressalta que não é alvo das investigações. A empresa acredita que os fatos serão esclarecidos pela Justiça e está à disposição para colaborar com as autoridades”.
Miguel Iskin
O advogado Alexandre Lopes, que defende o empresário Miguel Iskin, afirmou: “Mais uma prisão ilegal que será revogada pelos tribunais brasileiros. Trata-se de repetição de operação anterior, na qual custódia preventiva já foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal. Causa perplexidade a utilização como base da prisão depoimentos de um delator chamado Cesar Romero, que ouvido em Juízo, anteriormente, foi flagrado em várias mentiras. Suas delações deveriam ser anuladas, e não usadas como arrimo de prisão ilegal.”
Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad
A instituição afirmou que “está à disposição para esclarecimentos da investigação”.
Lista de prisões temporárias de:
1. Luiz Sérgio Braga Rodrigues
2. Márcia de Andrade Oliveira Cunha Travassos
3. Albert Holzhacker
4. Frederik Knudsen (Vendedor da Philips do Brasil)
5. Daurio Speranzini Júnior ((Ex-CEO da Philips do Brasil)
6. Ermano Marchetti Moraes (Ex-CEO da Dräguer)
7. Julio Cezar Alvarez
8. Daniele Cristine Fazza da Veiga
9. André Luiz Loyelo Barcellos
Também foram decretadas as prisões preventivas de:
1. Miguel Iskin (empresário)
2. Gustavo Estellita (empresário)
3. Marco Antônio Guimarães Duarte de Almeida
4. Marcos Vinicius Guimarães Duarte de Almeida
5. Gaetano Signorini
6. Wlademir Rizzi (Rizzi Comércio e Representações Ltda)
7. Adalberto Rizzi (Rizzi Comércio e Representações Ltda)
8. Antônio Aparecido Georgete (ex-vendedor da Dixtal)
9. Ivan Console Ireno (Ex-vice-presidente da Dixtal/Philips)
10. Jair Vinnicius Ramos da Veiga (Into)
11. Luis Carlos Moreno de Andrade
12. João Batista da Luz Júnior
13. Rafael dos Santos Magalhães