Referências: Geografia Econômica da Saúde no Brasil e Jornada da Gestão em Saúde no Brasil
(*) todos os gráficos e ilustrações são partes integrantes do Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e do material didático dos cursos da Jornada da Gestão em Saúde e da Escepti
Conforme o tempo foi passando, foi diminuindo a diversidade de calçados masculinos e femininos:
- A diversidade ainda existe … e é muita ainda … mas existe uma grande parcela da população que usa alguns tipos de tênis (o “all star” por exemplo) “que é o mesmo calçado” para homens e mulheres;
- Para definir o “produto calçado” necessitamos definir o tamanho do pé, e em alguns casos definir o sexo;
- Mas o nº 36 e o nº 40 é o mesmo produto … só muda o tamanho … não interessa se quem vai comprar é criança, adolescente, adulto, idoso … uma vez definido o modelo e o número, o produto é o mesmo !
Quase 100 % de todos os produtos que existem … que são consumidos pela população … são assim.
Sejam fornecidos pelo governo (serviços públicos):
- A eletricidade é a mesma independente de quem consome – até existem tarifas diferentes para pessoas e empresas … mas é a mesma eletricidade;
- E isso vale para telefonia, saneamento, transportes …
Sejam os adquiridos pelas pessoas e empresas:
- Tal qual o calçado … o leite, a cerveja, o celular;
- Uma vez definido um tipo / modelo … o produto vendido é o mesmo.
Até educação pública ou privada, por exemplo:
- Alguns parâmetros definem o produto (ensino básico, médio, superior, pós … especialização);
- Você até tem programas de alfabetização diferentes para crianças e idosos;
- Mas o curso superior, por exemplo, é o mesmo … pouco interessa se na sala tem homem ou mulher … pós-adolescente, adulto ou idoso … atleta ou cadeirante …
- O planejamento, seja o público, seja o privado, na educação é feito baseado em poucos parâmetros !
Como seria simples planejar e remunerar a saúde privada ou pública, se o “produto saúde” fosse assim !!
Um mesmo procedimento … uma artrodese de coluna … uma artrodese de quadril …
- Não é o mesmo produto se envolve um homem ou uma mulher … se envolve um recém-nascido, criança, adolescente, adulto, idoso ou “muito idoso”;
- Não é o mesmo produto para um paciente que possui necessidades especiais … que tem outras doenças crônicas …
- O que é necessário entregar consome insumos diferentes e eventualmente exige até profissionais muito diferentes, embora da mesma especialidade, com especializações diferentes … um enfermeiro é muito diferente de um enfermeiro especializado em UTI … um médico ortopedista generalista é muito diferente de um especializado em coluna, e por sua vez muito diferente de em especializado em cirurgia oncológica em coluna !
- E ainda pode envolver outros procedimentos dependendo do caso – este “reparo na coluna ou na coluna” para determinados pacientes pode demandar acompanhamento psicológico, dependendo do que originou o procedimento;
- Procedimentos como este exemplo podem ser decorrentes do desgaste da idade ou acidente ou violência … ou estupro !! … dependendo do caso “o pacote” que envolve o caso é completamente diferente !!!
Até a capacitação do médico, da equipe de retaguarda … a conduta definida, os protocolos adotados pela instituição … definem produtos diferentes.
Os procedimentos na saúde estão permeados por vários cenários que demandam coisas diferentes caso a caso.
Então quando o secretário da saúde vai planejar seu orçamento … quando a área atuarial de uma operadora vai planejar a sinistralidade:
- Necessita relacionar os procedimentos com o perfil epidemiológico da “amostra”;
- A amostra na saúde pública é a população dependente SUS – a que não possui plano de saúde;
- A amostra na saúde suplementar regulada são os beneficiários dos planos de saúde de cada operadora;
- A amostra na saúde suplementar não regulada é a parcela da população que se enquadra nas classes A e B no caso dos procedimentos da alta complexidade, ou a população total no caso de insumos de baixo custo – tanto os produtos caros como os baratos que são vendidos em farmácias !
Se observarmos a pirâmide populacional do Brasil:
- Apesar do envelhecimento da população, ainda temos a maior parte da população entre 14 e 40 anos;
- Então um produto que adere mais às faixas etárias superiores em homens (doenças na próstata por exemplo, que prevalecem na terceira idade nos homens) não tem como ser planejado da mesma forma que um procedimento que ocorre em outra faixa etária e gênero (parto, por exemplo, que prevalece entre 18 e 35 anos, em mulheres) !
Que bom … que ótimo … seria se pudéssemos pegar esta pirâmide populacional e definir o planejamento do SUS … ou planejar a rede credenciada de uma operadora de planos de saúde … como seria simples !!
Longe disso !!!
Ao observarmos as pirâmides populacionais das 5 Regiões do Brasil entendemos que aquela anterior não serve para muita coisa no planejamento do SUS, nem das operadoras … como é média do Brasil, na média não serve para região alguma:
- A distribuição idade – sexo é muito diferente de uma para outra;
- O planejamento feito para uma não adere às outras;
- Vemos as Regiões Sul e Sudeste “mais velhas” … as Norte e Nordeste “mais jovens” … e a Centro-Oeste “meia muçarela meia calabresa” em relação às demais !
Isso já sinaliza que planejamento em saúde não é coisa para amadores … não é verdade ?
Mas se somente segregar as informações por Macrorregião do Brasil já fosse suficiente, os gestores da saúde pública e privada “seriam imensamente felizes” … mas somente isso não basta … mas não basta mesmo !!
As quatro pirâmides de cima ilustram os 4 Estados da Região Sudeste … 4 estados da mesma região:
- Minas Gerais é “muito mais jovem” do que os demais;
- Espírito Santo e Rio de Janeiro são “mais velhos” … e neste caso a “meia a meia” é São Paulo.
E não para por aí:
- Se pegarmos 2 municípios importantes de Minas Gerais … os gráficos de baixo …
- … Belo Horizonte tem pirâmide muito diferente de Uberlândia !
- Planejar saúde “meu amigo” … é coisa para profissionais !! … que conhecem “o seu eleitorado” específico !!!
Não é somente definir a frequência dos procedimentos:
- É necessário associar a frequência dos procedimentos nas parcelas da “amostra” específica;
- Se a aderência é grande … se a proporção é grande … pode definir a existência de um serviço, mesmo que este procedimento tenha frequência menor que muitos outros;
- Se a aderência é pequena … se a proporção é pequena … o fato da frequência ser elevada não necessariamente define a existência de um serviço para realizar este procedimento.
Assim o gestor capacitado fica pensando o tempo todo:
- Ter um serviço no local ou utilizar um serviço de outro local ?
- Ter o serviço na rede própria ou credenciar um terceiro ?
Acredite em uma pessoa que já produziu muitos estudos destes … que desenvolveu o Estudo Geografia Econômica da Saúde no Brasil e discutiu dados com milhares de gestores nos eventos:
- A complexidade disso é desafiadora … mas é muito motivante;
- É algo sensacional de ser feito, porque quando aplicado na prática vai definir se o acesso da população ao SUS … se o acesso do beneficiário da operadora ao serviço próprio ou credenciado … enfim … se o acesso do necessitado será adequado, ou se haverá “pranto e ranger de dentes”;
- Como, em qualquer tipo de coisa, os recursos são escassos … produzir estes estudos para maximizar o resultado dos recursos que a gente tem é absolutamente recompensador !!!
Que pena que o governo “brincou” com a importância disso … que pena que ele politizou isso:
- O Censo que nos dá informações para definir o perfil epidemiológico é feito a cada 10 anos;
- E na verdade, com a rapidez que as coisas mudam já há algumas décadas no mundo … este intervalo de 10 anos já deveria ter sido encurtado … um censo a cada 5 anos seria muito útil para planejarmos saúde de forma mais adequada … mais assertiva … gastaríamos “menos dinheiro” para fazer as coisas de forma bem melhor …
- Mas o último censo no Brasil foi realizado em 2010 … deveria ter sido feito em 2020 … estamos em 2022 … 2 anos atrasado … e pelo jeito ainda vai atrasar mais;
- Infelizmente o governo “se faz de morto” e não quer priorizar isso que é importante … o importante agora para ele são as eleições … infelizmente !
Nós temos um outro problema:
- Temos uma infinidade de gestores na área da saúde ainda despreparados para lidar com coisas deste tipo;
- E fazem uma “montanha de lambanças” por conta desta “descapacitação”;
- Não consideram perfis populacionais … perfis de carteira … e se arriscam a discutir modelos de remuneração;
- Gestor despreparado para discutir negócios na área da saúde é a pior da pior da pior das coisas que podem ocorrer;
- Perdem negócios, desassistem beneficiários do SUS e das operadoras.
É um “show de horror com honra ao mérito”:
- Definem pacotes em operadoras que não vingam;
- Analisam pacotes em serviços de saúde inadequadamente e, ou perdem negócios, ou geram prejuízo, especialmente em hospitais nos procedimentos de mais alta complexidade;
- Não avaliam adequadamente as propostas de remuneração de compartilhamento de riscos;
- Ficam discursando “papos de aranha” em modelos de remuneração baseados em valor que só existem em TCCs, Apostilas de Cursos e Seminários … na prática “neca de pitibiriba” !
Por isso fiquei muito contente ao ser convidado novamente para ministrar uma aula de Modelos de Remuneração em uma turma de Pós-Graduação da Faculdade Einstein na semana passada no Rio de Janeiro – sempre agradecendo as Profas. Deise de Carvalho, Glauce Roseane de Almeida Brito e Marcela Marrach Coutinho pela oportunidade de discutir isso com gestores de fontes pagadoras, serviços de saúde e fornecedores de insumos, então: em um ambiente sem vieses … muito obrigado !!!
E, é claro, que o tema faz parte do curso Práticas Comerciais da Área da Saúde Pública e Privada no Brasil da Jornada da Gestão em Saúde de Junho com quase 100 participantes … de operadoras, hospitais e fornecedores … outra grande alegria pela grande adesão !
Imagine se eu poderia ministrar cursos de pacotes para serviços de saúde e operadoras de planos de saúde, como os programados para julho próximo, sem inserir na ementa esta análise ? … sem discutir como isso pode ser “o fiel da balança” para o projeto de pacote ter ou não sucesso na prática !
Ver gestor que nunca negociou na prática contratos entre fontes pagadoras e serviços de saúde, discutindo valor em saúde é umas das coisas que eu nunca gostaria de ter vivido para ver … “e tá cheio” ! … nunca tive o prazer de ver um que conhecesse o que discutimos aqui pelo menos para construir uma narrativa para levar vantagem … tudo que vi foi baseado “na pirâmide populacional do Brasil lá de cima”, se é que me entende pela analogia do texto !!
Mas quando vemos um projeto bem-feito, adequadamente embasado … é muito legal … talvez não tenha nada mais legal na gestão da saúde do que isso !!!
Leia mais de Enio Salu:
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“Negócios na Saúde Privada e Pública | 7 x 1 | Desaforos do Governo ao SUS e a Saúde Suplementar”, por Enio Salu
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“10 mandamentos para gestão do faturamento hospitalar”, Enio Salu
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“O Que Interessa Para Quem na Área da Saúde”, por Enio Jorge
Enio Jorge Salu tem especializações em Administração Hospitalar, Epidemiologia Hospitalar e Economia e Custos em Saúde pela FGV – Fundação Getúlio Vargas. É professor em Turmas de Pós-graduação na Faculdade Albert Einstein, Fundação Getúlio Vargas, FIA/USP, FUNDACE-FUNPEC/USP, Centro Universitário São Camilo, SENAC, CEEN/PUC-GO e Impacta. Coordenador Adjunto do Curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar da Fundação Unime. Também é CEO da Escepti Consultoria e Treinamento e já foi gerente de mais de 200 projetos em operadoras de planos de saúde, hospitais, clínicas, centros de diagnósticos, secretarias de saúde e empresas fornecedoras de produtos e serviços para a área da saúde e outros segmentos de mercado.