“A diferença entre desenvolver pacotes e inviabilizar parcerias”, por Enio Jorge Salu

Amanhã a turma do curso “Como Avaliar Preços de Pacotes em Hospitais” … da programação da Jornada da Gestão em Saúde, que na semana que vem tem o curso “Como Definir e Precificar Pacotes em Operadoras de Planos de Saúde” cursos com o mesmo “pano de fundo” mas com as visões completamente diferentes que se formam nas fontes pagadoras e nos serviços de saúde.

Além dos participantes de todos os módulos da Jornada (a turma de 40 horas) e dos “convênios” com instituições de ensino em turmas de pós, os que se inscreveram nelas especificamente formam um grupo que mescla hospitais, operadoras, reguladora, fornecedor e fundação de apoio de serviço de saúde … muito legal discutir o tema com profissionais de “um lado e de outro da mesa” de negociação … e como se vê: “de cima e de baixo da mesa” também!

Começamos conceituando o objetivo:

  • O que se quer com o projeto de pacote ?
  • Existem diferentes motivações, que disparam ações de desenvolvimento muito diferentes;
  • Se o objetivo é pagar o menor preço independente do produto que pode ser entregue, sempre recomendo não utilizar pacote para isso … o “efeito colateral” pode ser “pior do que a doença”;
  • Já presenciei mais de um cenário em que a operadora economizou no preço, mas pagou “uma fábula” de multas e ressarcimentos ao SUS … pode custar caro … até porque, no caso de operadoras que não são autogestão, voce nem consegue contabilizar quantos beneficiários perdem: números que ficam debaixo do tapete.

Utilizar pacotes como alternativa de precificação, desde que adequadamente desenvolvido, é absolutamente viável tanto para a operadora como para o serviço de saúde … mas, desde que adequadamente desenvolvido:

  • Operadora de Planos de Saúde tem uma única análise neste desenvolvimento, mas Serviço de Saúde tem 3 análises diferentes para fazer;
  • Porque a conta hospitalar “se liga” na operadora na área de custos …
  • Mas no serviço de saúde se liga em toda a cadeia de valores envolvida na realização do procedimento: o próprio serviço, o fornecedor, o médico …

Esta “ligação” do serviço de saúde com fornecedores, médicos, dentistas, obriga o gestor a “ampliar o campo de visão”:

  • A operadora faz uma contabilidade simples: qual o valor mínimo que dá para pagar a partir da negociação ?
  • No serviço de saúde não é somente isso … é isso também;
  • Existe uma ligação entre os procedimentos … pode ser interessante ou não ter lucro ou prejuízo em um deles … a análise sempre é de contexto … não necessariamente analisar o procedimento isoladamente;
  • Mesmo nas contas abertas o serviço de saúde pode estar tendo prejuízo … isso não é anormal … em determinadas situações é a regra e não a exceção, diga-se de passagem !

Margem de Comercialização, custo e oportunidade são 3 análises diferentes que o hospital deve desenvolver !

A “oportunidade” requer envolvimento multidisciplinar … por mais incrível que possa parecer, é muito comum em hospitais o gestor comercial, que vende o produto, não conhecer o produto que vende:

  • É comum não ter formação assistencial, e portanto ter dificuldade no entendimento dos aspectos técnicos;
  • É comum não ter vivência … não conhecer bem … as diversas unidades que compõem o hospital;
  • É comum ter vindo de operadora … ter formação em direito … nunca ter sentido o cheiro de uma unidade de internação … não entender como são diferentes as rotinas e os produtos de cada SADT;
  • É comum não saber a diferença real entre UTI e UTI Neonatal … sabe que uma é para um tipo de paciente e outra para outro tipo de paciente … mas se entrar nas duas e não tiver leitos, não sabe diferenciar uma da outra !

Na precificação tradicional já é necessário o apoio da área assistencial … quando tratamos de pacotes: mais ainda!

O básico quando desenvolvemos pacotes é não negligenciar cada uma das causas que fazem os preços serem diferentes:

  • As operadoras têm carteiras de beneficiários diferentes;
  • Os beneficiários das operadoras escolhem serviços de sua preferência, desenvolvendo sub carteiras de beneficiários diferentes;
  • E os preços também variam em função de condições regionais … logística, tributos, disponibilidades, infraestruturas públicas e particulares dos serviços.

Um ponto chave, que não pode ser negligenciado de forma alguma, é o fato de que nem todo dinheiro que passa pelo serviço de saúde é dele:

  • Hospitais estabelecem diversos tipos de parcerias com prestadores e fornecedores, se tornado em determinadas situações “meio que sócios” deles;
  • Quando o cenário envolve cooperativas médicas, fonte pagadora e serviço de saúde “quase que se fundem” para viabilizar determinados sub serviços.

O projeto que mistura tudo isso achando que “o pacote vai corrigir o mundo” … “enquadrar fulano” … fracassa:

  • Pode fracassar sendo abortado precocemente;
  • Ou pior … pode ser formalizado, e na prática não acontecer … uma espécie de “me engana que eu gosto” … pior tanto para a operadora (judicialização) como para o serviço de saúde (produção).

Como em qualquer segmento de mercado, quando existem interlocutores bem-preparados e bem-intencionados nos dois lados da “mesa de negociação”, tudo é possível … tudo pode ser viabilizado como negócio:

  • Aplicar a metodologia adequada de análise;
  • Estar munido de alternativas para os pontos de impasse, que no caso dos pacotes existem de fato;
  • E, apesar de interesses comerciais antagônicos, saber separar o que é viável do que é “discurso” !

Existem projetos de pacotes que produzem produtos genuínos … e existem projetos de pacotes que “macaqueiam” os objetivos … “macaquear” na tradução literal do dicionário formal: uma “imitação ridícula” de algo … como um tênis “de marca”, que não foi produzido “pela marca” … falsificado … fake !

A operadora, é claro, sempre vai tentar reduzir o preço global:

  • Porque juntamente com o governo, são os únicos atores nos sistemas de financiamento privados e públicos que atuam no risco;
  • O governo atua no segmento da saúde por obrigação constitucional … políticos odeiam ter que lidar com ela;
  • Mas a operadora está no segmento da saúde por opção … ninguém obriga operadora a ser operadora;
  • Ela que escolhe atuar no risco e, é claro, vai fazer de tudo para reduzir sua sinistralidade … nada de ilegal, nada de imoral, absolutamente nada a ser criticado … é o que faz qualquer empresa que atua no risco (seguradoras, empresas de investimentos …).

O serviço de saúde, o fornecedor, o médico … devem estar preparados para entender as propostas, avaliar e separar “o joio do trigo”:

  • Se o serviço de saúde não está preparado para avaliar adequadamente o pacote, não se pode culpar a operadora;
  • Ela fez lá a análise dela … pode não saber exatamente o impacto em cada serviço de saúde;
  • As mais estruturadas têm profissionais que avaliam o impacto individualmente com mais assertividade … mas não todas elas têm.

O fato é que pacotes não se desenvolveram como poderiam … embora o potencial seja gigante … e o maior motivo é que ainda não temos um bom contingente de gestores que dominam as metodologias de desenvolvimento … de análise …

  • Por incrível que pareça tem mais gente envolvida nisso “por preguiça” de lidar com contas abertas … com os sistemas de informação que temos hoje, “o trabalho” de lidar com elas é “ridiculamente pequeno” … esta motivação já há algum tempo passou a ser vergonha: “escancara” a falta de controle que existe na empresa;
  • Temos áreas adequadamente profissionalizadas quase que exclusivamente nas grandes operadoras e nos grandes hospitais … que como sabemos, estas empresas formam “a minoria da minoria da minoria” das empresas que existem no segmento da saúde !
  • Precisamos de mais gestores capacitados permeando as médias e pequenas operadoras … os médios e pequenos serviços de saúde;
  • Por isso a satisfação de estar podendo contribuir, além das consultorias, nas aulas e cursos !

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