O Fórum 2024 da Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde, que chegou à sétima consecutiva foi realizado no Inrad, dentro do complexo do Hospital das Clínicas da USP, em São Paulo, com o tema “Cadeia de Valor em Saúde resiliente e sustentável: Desafios e Propostas do Setor de Dispositivos Médicos”. Na abertura, o gerente executivo da ABRAIDI, Davi Uemoto, ressaltou os desafios do segmento. “Estamos aqui porque os problemas continuam e são crônicos”, contextualizou. A solução passa por uma mudança estrutural que deverá contemplar pelo menos três pilares: Transparência, Integridade e Eficiência. Vetores que, juntos, trarão mais resiliência ao sistema de saúde.
O presidente da Associação, Sérgio Rocha, lançou oficialmente a 7ª Edição do Anuário “O Ciclo de Fornecimento de Produtos para Saúde no Brasil”, durante o Fórum 2024. A pesquisa revelou que as distorções se acentuaram muito nos últimos 12 meses com valores mais expressivos de retenções de pagamento, glosas injustificadas e inadimplência impostas por planos de saúde e hospitais às empresas fornecedoras. O montante de pagamentos pendentes ou perdidos chegou a insustentável marca de R$ 3,8 bilhões. Desse total, R$ 2,3 bilhões estão relacionados à retenção de faturamento, quando a fonte pagadora (plano de saúde ou hospital) não permite o faturamento, após a realização de uma cirurgia previamente autorizada. As glosas injustificadas chegaram à R$ 180 milhões e a inadimplência à R$ 1,3 bilhão.
Sérgio Rocha questionou se reter o faturamento de cirurgias já realizadas é correto. “Estamos vivendo aqui um dilema ético e pouco tem sido feito. Posso pensar que isso soa como uma máfia das retenções, já que acontece de forma sistemática, assim como as glosas. Não são negociações comerciais, são situações impostas pelos planos de saúde e hospitais aos distribuidores e importadores. Todos os órgãos e as agências reguladoras fecharam as portas para nós e lavaram as mãos sobre esse assunto”, afirmou Sérgio Rocha.
O primeiro painel discutiu o “Panorama da distribuição de dispositivos médicos no Brasil”. O diretor executivo do Instituto Ética Saúde, Filipe Signorelli, destacou que é possível encaminhar a temática das glosas para serem discutidas nas agências reguladoras ou no Ministério Público por meio do IES. “Precisamos dos depoimentos de vocês. Entrem em contato comigo ou façam de forma anônima em nosso Canal de Denúncias. Estamos aqui para defender todos os elos da cadeia”, conclamou Filipe Signorelli.
Os debatedores da mesa e participantes da plateia abordaram a entrada de planos de saúde e hospitais no setor de distribuição. O presidente da ABRAIDI ressaltou que, na visão dele, existe um grande conflito de interesse. O CEO da Cortical, Cassius Maggioni, lembrou que é muito difícil atuar no mercado da distribuição, “por isso vemos tanta gente entrando e depois saindo. Somos parte da solução do bom atendimento e dos resultados e os planos de saúde e hospitais precisam entender mais isso”, completou. O sócio fundador da Marin Medical, Ronaldo Sampaio, que também é vice-presidente da ABRAIDI, acredita que a distribuição não irá acabar. “Eu não sou arara azul e não estou em extinção, já que vemos grandes grupos de investimentos querendo entrar no nosso segmento. Temos uma importância fundamental na cadeia toda. Dificilmente alguém terá a capacidade de fazer o que nós fazemos”, argumentou. Já o diretor Executivo da Porto Surgical, Edson Aguiar, acredita que a distribuição irá mudar nos grandes centros e que é preciso valorizar todos os serviços que o distribuidor agrega. O sócio fundador da Implamed, Eduardo Simões, comentou que é importante lembrar que estamos num momento pós-pandemia onde a economia esteve parada por quase dois anos. “Ainda vivemos as consequências disso. Os planos de saúde podem até montar uma distribuição, mas não com o dinheiro das retenções de faturamento”, concluiu.
O segundo painel discutiu a “gestão eficiente da cadeia de suprimentos de dispositivos médicos: como reduzir as ineficiências da cadeia de valor em saúde?”. A moderação foi de Davi Uemoto e contou com a participação de expoentes de supply chain, área que interliga todas as operações pelas quais um produto passa, desde a matéria-prima até o processo de entrega ao cliente final.
O gerente da Associação contextualizou lembrando que há um espaço muito grande para melhorar a operação. “Seria interessante fazer um mapeamento da cadeia de valor, mas imagino que não seja tão fácil. São questões que envolvem o gerenciamento de demanda, a operação logística, a tecnologia, a resiliência e a formação de capital humano especializado. O CEO da Sinnergy, Marcos Castelo, concordou e comentou que “temos enormes desafios e precisamos nos reinventar. A ineficiência beneficia muitos elos da cadeia, infelizmente”, completou. Para o diretor de Supply Chain da Medtronic, Victor Marques, que há 16 anos atua na área de medical device: “estamos 20 anos atrasados e numa cadeia de desconfiança. Precisamos mudar, pelo menos, para um sistema mais colaborativo e de integração entre todos. Em outros segmentos sempre tem alguém que puxa a inovação e o desenvolvimento. Na saúde não existe ninguém. Temos medo de colaborar e assim iremos morrer abraçados se não buscarmos diminuir a ineficiência”, defendeu Victor Marques.
Já o diretor da BU Medtech, representando o Grupo Elfa, Leonardo Moraes, lembrou que a sinistralidade aumentou 10 pontos percentuais depois da pandemia. “O que revela uma ineficiência, mas também que devemos melhorar em breve, porém precisamos de mais transparência entre os entes, caso contrário a gente não chega numa solução comum”. O CEO da Endolog, Giuliano Santanna, afirmou que o distribuidor está se reinventado com uma transformação para fazer mais e melhor e aprimorando o profissionalismo com um modelo cada vez mais claro e transparente. “E onde existe colaboração conseguimos evoluir bastante”, afirmou sobre a cadeia de saúde como um todo.
O Fórum ABRAIDI terminou com uma mesa formada por executivas e tratou da “liderança transformadora: unindo alta performance e sustentabilidade”. As integrantes debateram a importância do líder na construção de uma cultura organizacional sustentável, no desenvolvimento de negócios de longo prazo e na proposição de mudanças na cadeia de valor. A mediação foi feita pela CEO da Zentys Medical, Soraya Capelli, que ressaltou a necessidade de modificações no pensamento, na liderança do time, nos negócios e na cadeia. “De maneira ampla é ver como tudo se sustenta e que iremos passar por grandes transformações”. A CEO da Braile Biomédica, Patricia Braile, defendeu que a mutação passa pela educação e o combate à impunidade. “Os números da ABRAIDI são estarrecedores. O que será do nosso presente e futuro? Sozinhos não conseguimos nada. Precisamos de mais elos da cadeia junto, não só de um segmento, para chegarmos numa solução”, argumentou a executiva.
A CEO do CBEXs, Tacyra Valois, comentou que Patricia Braile tinha levantado a bola para ela, já que o CBEXs é uma entidade de cunho educacional. “A grande missão do CBEXs é a mudança de cultura para a gestão de problemas complexos e para isso precisamos iniciar com diálogos para que cada um possa entender o problema do outro”, finalizou. A CEO SP Intervention, Candida Bollis, foi bastante crítica e disse que a gestão da saúde é muito ruim e comentou que todos estão pagando esse preço. “Quem não se reinventar, não irá sobreviver. É um mercado grande que precisa estar mais bem preparado. Todo dia temos decisões difíceis e temos que encarar essa dívida de gestão”. Candida Bollis falou ainda sobre ter assumido, recentemente, a presidência do Instituto Ética Saúde. “Foi uma decisão complicada, mas eu sempre briguei por isso e acredito na causa. Agora precisamos de ajuda de todo o mercado para que denúncias sejam feitas em nosso Canal para enxergarmos onde estão os problemas mais graves e assim chegaremos nos caminhos para encontrar soluções comuns. O complicado é se tiver algum segmento que não esteja disposto para sentar e dialogar”, concluiu.
“A conclusão que chegamos é que um novo pacto para a saúde precisa ser firmado com urgência, para que a população siga sendo atendida com insumos que são essenciais para a vida. Esperamos que o Fórum tenha sido um divisor de águas para um novo tempo, onde possamos ver, na pesquisa do ano que vem, um inédito quadro muito melhor do que estamos vendo hoje”, completou o presidente da ABRAIDI, Sérgio Rocha.
O evento teve o patrocínio da Diferencial Tributária, da Viman Sistemas, da Health Mercantil, apoio da ABIIS, do Instituto Ética Saúde e fez parte da agenda de eventos do Visite São Paulo.