Representando mais de 100 operadoras de autogestão em todo o país que atendem mais de 4 milhões de pessoas, a Unidas – União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde – exerce uma voz de extrema relevância no setor.
As autogestões têm em sua carteira, em média, 30% de idosos, população mais atingida pela Covid-19. “Isso traz uma carga maior para nós. Todos os nossos esforços em 2021 foram concentrados para cuidar dessas pessoas. A atenção primária está no nosso DNA, primeiro pela própria vocação de autocuidado, segundo pela longevidade das pessoas em nossa carteira”, explica Anderson Mendes, presidente da UNIDAS.
Em entrevista para a HCM, Mendes defende a necessidade de um olhar diferente para as autogestões.
“Muitas vezes, nós estamos sob regramento único, a mesma que dita as seguradoras e medicina de grupo. No entanto, as operadoras têm o poder de escolher em não atuar em uma determinada região, diferentemente de nós. Se um beneficiário no interior do Amazonas precisa de nós, nós vamos até ele.”
- Como foi o ano de 2021 para o segmento de autogestão na saúde no Brasil?
Os desafios foram semelhantes ao do setor de uma forma geral, mediante a pandemia inesperada. O ano de 2021 foi de reflexos de 2020, em que tivemos um repique de procedimentos que não foram realizados ano passado devido a demanda reprimida. Também tivemos uma segunda onda de Covid-19, mais forte que a anterior, com internações mais longas. Isso tudo sobrecarregou o sistema. Um dado importante é que as autogestões têm em sua carteira, em média, 30% de idosos, população mais atingida pela Covid-19. Isso traz uma carga maior para nós. Todos os nossos esforços em 2021 foram concentrados para cuidar dessas pessoas.
- Quais foram os principais desafios deste setor neste ano?
Tivemos que realizar a chamada busca ativa, indo atrás dos beneficiários que não podem suspender seus tratamentos. Trabalhamos fortemente, antes mesmo da pandemia, na prevenção de doenças. Isso é o grande desafio para nos mantermos sustentáveis, retardando ao máximo as doenças ou, quando elas chegarem, que seja de forma mais branda e com menos custos.
- Atualmente, quais são as principais reivindicações levantadas pela Unidas?
O que está em nossa pauta é a falta de um olhar para as autogestões. Como não buscamos lucro, nós deveríamos sim ter um tratamento diferenciado. Muitas vezes as autogestões estão sob regramento único, a mesma que dita as seguradoras e medicina de grupo. No entanto, eles têm o poder de escolher em não atuar em uma determinada região, diferentemente de nós. Se um beneficiário no interior do Amazonas precisa de nós, nós vamos até ele. Nossos anseios são de poder sensibilizar as pessoas que os diferentes precisam de tratamentos diferentes. Ninguém está falando de privilégio, mas sim de um olhar especial, porque muitas vezes nós não conseguimos competir no mercado. Quando se perde autogestão, as pessoas vão para o SUS, porque, dificilmente, o mercado privado estará nesse lugar ou esse paciente terá condições de pagar um plano privado.
- Segundo Pesquisa Nacional Unidas 2021, processos judiciais custaram cerca de R$ 30 milhões para operadoras de planos de saúde do modelo de autogestão, entre 2017 e 2019. Qual a sua avaliação sobre esse dado?
Precisamos criar um regramento aos planos de saúde. Sabemos que é mais fácil um gestor de plano de saúde autorizar o tratamento, que é a vontade do beneficiário, mas esse recurso é dado para cuidar de todos. Por isso, é preciso criar regras muito claras que, muitas vezes, o judiciário não sabe. Por exemplo, nós temos um roll da ANS que diz qual cobertura o plano de saúde deve oferecer. Quando o indivíduo busca na justiça o direito para realizar determinado procedimento que está fora da cobertura planejada, você leva então, o paciente a ter um tratamento diferenciado em relação a outras pessoas. E quem vai pagar essa conta não é o plano de saúde, é todo mundo!
- É a visão equivocada de que os planos vão pagar a conta…
Exatamente. Nenhum plano paga nada. O que ele faz é uma intermediação entre as pessoas e as empresas. A judicialização é importante para proibir abusos, mas esse recurso é usado, muitas vezes, de forma errônea, para garantir um direito individual. Isso acarreta em um maior custo para todos do setor.
- Muito se fala sobre investir na prevenção e atenção primária. Como as autogestões têm trabalho nesse sentido?
Somos pioneiros nessa abordagem. A atenção primária está no DNA das autogestões, primeiro pela própria vocação de autocuidado, segundo pela longevidade das pessoas em nossa carteira. Nós temos clientes que estão há quarenta anos conosco, o que, no mercado privado, muitas vezes as empresas, devido a alta competitividade, precisa trocar de plano de saúde de seus funcionários e por isso essa longevidade é mais difícil de acontecer. Com clientes de longa data, é muito mais interessante investir em atenção primária, porque esse indivíduo provavelmente se manterá no futuro.
- Quais são as perspectivas do setor de autogestão para 2022?
As perspectivas são positivas. A pandemia nos trouxe muita preocupação e tristeza, mas deixou o legado da importância de cuidar da saúde. A empresas são parceiras nessa questão do cuidado e as associações não fugiram dessa responsabilidade. Esperamos um engajamento maior de nossos beneficiários e empresas para que todos entendam a importância de estarem juntos. Há também essa ligação entre plano de saúde e beneficiário por meio das novas tecnologias, como foi com a telemedicina.
- E por falar em telemedicina, como foi esse atendimento nas autogestões?
A Unidas foi a única instituição a colocar disponível para suas 110 filiadas (mais de 4 milhões de pessoas) uma plataforma de telemedicina durante a pandemia. Nossa preocupação era manter o contato e apoio ao beneficiário.
- Como você avalia o comportamento do paciente nos próximos anos quanto ao seu uso do sistema de saúde?
É necessário ter um consumo mais consciente do serviço de saúde. Não podemos usar o Pronto Socorro como um grande ambulatório. Podemos fazer uma triagem via telemedicina, procurar um consultório e ter um atendimento de atenção primária, e buscar a atenção terciária apenas quando necessário, e assim teremos custos mais adequados e melhor cuidado de saúde. O pronto socorro não é a melhor solução para cuidar de todas as nossas demandas. Temos que fazer esse redesenho do sistema de saúde e entender melhor como garantir a assistência do beneficiário, e, ao mesmo tempo, trazer maior sustentabilidade do setor.
- Quais são as atuais ações da Unidas?
Estamos trabalhando em diversas ações que nos aproximam da indústria, buscando maior transparência e que reduza o desperdício, que chega a margem de 40% dos gastos. Isso é inimaginável. O SUS, em 2020, gastou em torno de R$ 150 bilhões para 75% da população que usam exclusivamente a saúde pública. Já a saúde suplementar, para cuidar de 25% dos brasileiros, gastou R$ 218 bilhões. Isso demonstra claramente o desperdício. Continuaremos o diálogo com os players a fim de proporcionar mais eficiência, com modelos de pagamento que direcionam para o maior controle de desperdício.
Esta reportagem foi publicada na 80ª edição da HCM. Clique aqui e confira.