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Antônio Britto, da Anahp, defende mudanças estruturais para garantir sustentabilidade da saúde suplementar em 2025

Apesar da recuperação financeira das operadoras de planos de saúde, os hospitais enfrentam obstáculos crescentes. Em entrevista à Healthcare Management, Antônio Britto, diretor-executivo da Anahp, fala sobre as reformas necessárias para garantir a sustentabilidade do setor e melhorar o acesso e a qualidade do atendimento

Os recentes dados divulgados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) confirmam um forte crescimento econômico-financeiro das operadoras de planos de saúde, com um lucro líquido de R$ 11,1 bilhões em 2024 – um aumento expressivo de 271% em relação ao ano anterior. No entanto, essa recuperação não se reflete de maneira uniforme em toda a cadeia da saúde suplementar.

Enquanto as operadoras fortalecem suas margens, os hospitais privados enfrentam desafios crescentes. Um levantamento da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) revelou que, em 2024, R$ 5,8 bilhões em serviços prestados foram retidos por glosas administrativas, o que representa 15,89% do total a que os hospitais teriam direito – um aumento de 4 pontos percentuais em relação a 2023. O mais alarmante é que, após a análise dessas glosas, apenas 1,96% das recusas de pagamento foram justificadas.

O impacto dessa retenção de receitas é significativo. Segundo a Anahp, 41,7% dos hospitais precisaram reduzir investimentos ao longo de 2024 devido ao aumento das glosas. Isso significa menor capacidade para modernizar infraestrutura, ampliar leitos e investir em novas tecnologias, comprometendo diretamente a qualidade assistencial e a segurança dos pacientes.

Diante desse cenário, a necessidade de uma reforma estrutural no setor torna-se urgente. O modelo atual de remuneração, baseado no volume de serviços prestados, já não atende às exigências de previsibilidade e equilíbrio entre operadoras e hospitais. Além disso, fatores como a digitalização, a inteligência artificial e novas regulamentações devem moldar o futuro do setor, exigindo adaptação e inovação.

À Healthcare Management, Antônio Britto, diretor-executivo da Anahp, pontua a urgência de um novo modelo de relacionamento entre operadoras e hospitais, as expectativas para 2025 e o papel da tecnologia na evolução da saúde suplementar.

Antônio Britto, diretor-executivo da Anahp

Confira a entrevista exclusiva:

  1. Como a Anahp avalia os dados da saúde suplementar divulgados pela ANS?

A recuperação econômico-financeira das operadoras de planos de saúde, especialmente das maiores, é um dado positivo porque mostra que o setor está ganhando fôlego após períodos de instabilidade. No entanto, quando olhamos para o outro lado dessa equação – os hospitais –, vemos um desafio que ainda precisa ser discutido.

Um levantamento recente da Anahp identificou que, ao longo de 2024, os hospitais tiveram um total de R$ 5,8 bilhões em serviços prestados que tiveram o pagamento retido pelas operadoras por meio de glosas. Isso representa 15,89% do total que esses hospitais deveriam receber, um aumento de 4 pontos percentuais em relação a 2023. O mais preocupante é que o material também apontou que, após a análise destes pagamentos suspensos, somente 1,96% das contas glosadas eram realmente justificadas e foram mantidas.

Ou seja, enquanto as operadoras apresentam recuperação financeira, os hospitais enfrentam dificuldades para receber por serviços já prestados. Isso reforça a necessidade urgente de um novo modelo de relacionamento entre hospitais e operadoras, com mais previsibilidade, transparência e equilíbrio. No fim das contas, estamos falando de algo que impacta diretamente a sustentabilidade do sistema de saúde e, principalmente, o atendimento à população.

  1. Apesar da recuperação econômica das operadoras, a Anahp tem defendido a necessidade de uma reforma profunda no sistema de saúde suplementar. Por quê?

A sustentabilidade do setor de saúde suplementar depende de uma relação equilibrada entre todos os agentes envolvidos. Os hospitais, por exemplo, dependem diretamente das operadoras: cerca de 80% da receita vem dos serviços prestados aos clientes dos planos de saúde. Por isso, operadoras financeiramente saudáveis são essenciais. Mas essa saúde financeira não pode vir à custa de um desequilíbrio na cadeia.

  1. Quais mudanças são essenciais para garantir a sustentabilidade do setor no longo prazo?

O levantamento que fizemos também mostrou que, em 2024, 41,7% dos hospitais tiveram que reduzir investimentos por conta do aumento das glosas. Isso significa menos leitos, infraestrutura mais defasada e até impacto na qualidade do atendimento. No fim do dia, não são só os hospitais que perdem, mas também os pacientes e o próprio setor de saúde suplementar.

Por isso, defendemos que é hora de uma reforma profunda. Precisamos de um novo modelo de remuneração, que traga previsibilidade para os hospitais e incentive a qualidade do atendimento. Também é essencial fortalecer mecanismos de transparência e diálogo entre hospitais e operadoras. Se queremos um setor sustentável no longo prazo, precisamos construir um sistema mais justo e equilibrado para todos.

  1. Como a Anahp acredita ser possível avançar na implementação de modelos mais eficientes de pagamento?

A sustentabilidade do setor depende de um modelo mais equilibrado entre hospitais e operadoras. E um dos principais desafios para isso é justamente a forma como os serviços de saúde são remunerados. Hoje, ainda estamos muito presos ao fee-for-service, que remunera por volume, e não necessariamente por qualidade e desfecho clínico. Algumas modalidades, como pacotes, representam um avanço, mas ainda são ajustes dentro da mesma lógica. Para termos uma mudança real, precisamos ir além.

Temos atuado ativamente nessa agenda. O Programa de Desfechos Clínicos Anahp reforça nosso compromisso em avançar para um modelo de remuneração baseado em valor.

A mudança só será possível se houver disposição para o diálogo e um compromisso real de todas as partes em transformar a forma como entregamos saúde.

  1. Quais são os principais desafios que os prestadores de serviços de saúde enfrentam atualmente em termos de remuneração e sustentabilidade?

O setor de saúde suplementar enfrenta um momento desafiador. Em 2024, o número de novos beneficiários cresceu em um ritmo menor do que nos anos anteriores, com um aumento de apenas 400 mil vidas – e a maior parte dessa expansão ocorreu em planos coletivos por adesão de 1 a 5 vidas, um nicho que já começa a dar sinais de saturação.

Ao mesmo tempo, os hospitais estão lidando com um aumento expressivo nas glosas, já mencionado. Isso significa que os hospitais acabam sendo forçados a financiar parte dos custos enquanto aguardam a resolução desses processos, o que compromete o fluxo de caixa e limita a capacidade de investimento em infraestrutura, tecnologia e ampliação de serviços.

  1. Como a Anahp acredita ser possível resolver esses desafios?

Para resolver esse cenário, é essencial garantir previsibilidade financeira para os prestadores. Isso passa por uma relação mais transparente e equilibrada entre hospitais e operadoras, com processos de auditoria e contestação mais ágeis e justos.

Além disso, precisamos avançar na adoção de modelos de remuneração que incentivem a qualidade e a eficiência, garantindo que os investimentos dos hospitais possam ser direcionados para aquilo que realmente importa: melhorar o atendimento e a segurança dos pacientes.

  1. Com a perspectiva de 2025, o que podemos esperar de mudanças regulatórias ou de novos modelos de gestão que possam impactar a saúde suplementar no Brasil?

Tivemos um início de ano agitado para o setor de saúde suplementar com  troca de ministro da área da saúde e um novo presidente para a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), cuja votação do nome depende dos misteriosos processos de negociação do Senado. Por outro lado, o Judiciário, sem pressa, examina ações que pretendem suspender ou conceder prazos maiores para o debate sobre reformas nos planos de saúde. Na Câmara dos Deputados, as reformas aguardam o mínimo de consenso para avançar.

Ou seja, ainda é cedo para dizer se 2025 será um ano de mudanças estruturais na regulação da saúde suplementar, mas o setor segue atento. O que podemos esperar, no curto prazo, são avanços pontuais e ajustes regulatórios, especialmente em temas que já estão sendo debatidos há algum tempo. Por exemplo, um tema recente é a nova política de preços de medicamentos, que pode impactar diretamente os custos assistenciais. São mudanças que exigem atenção e diálogo contínuo para garantir que não gerem impactos negativos para hospitais, operadoras e pacientes.

  1. Quais são as prioridades da Anahp para garantir a melhoria contínua no acesso e na qualidade do atendimento para os beneficiários da saúde suplementar?

Além da função estratégica no cenário político e institucional, principalmente no desdobramento de temas essenciais à sustentabilidade do sistema como estes já citados, seguimos promovendo várias ações que transcendem os interesses das instituições associadas, como seminários e workshops dos grupos de trabalho da Anahp, capacitações e eventos abertos para todo o setor da saúde.

  1. Como você vê o papel da saúde suplementar na evolução da saúde digital?

Todo avanço que resulta em benefício a saúde do paciente é bem-visto pela Anahp. O crescimento e a aplicação da tecnologia na saúde têm sido imenso com várias ferramentas como softwares, dispositivos cada vez mais sofisticados e a Inteligência Artificial (IA). E isso vai desde a marcação de uma consulta via celular, até uma cirurgia robótica na qual o equipamento já recebe informações de exames do paciente para o procedimento que auxiliará o médico.

A saúde suplementar “puxa” estes avanços para o país porque tem mais recursos e mobilidade e isso é extremamente positivo para o setor como um todo. Poucos sabem, hoje, 58% dos procedimentos de média e alta complexidade realizados pelo SUS são feitos por meio de parcerias com hospitais privados. Isso reflete a sinergia entre os dois setores e a capacidade da saúde suplementar de contribuir para a evolução da saúde no país, especialmente quando falamos de inovação tecnológica.

  1. Quais são as principais metas da Anahp para 2025 e como elas se alinham com a missão e os valores da instituição?

As principais metas da Anahp para 2025 estão centradas em promover a sustentabilidade e o avanço do setor de saúde suplementar, sempre com foco na qualidade do atendimento e na inovação.

Como associação que representa hospitais de todo o Brasil, uma das nossas missões é ser um elo entre os prestadores de serviço e as operadoras, buscando um sistema de saúde mais justo e eficiente.

As mudanças que buscamos para 2025 e devem estar sempre em consonância com nossos valores de ética, transparência e sustentabilidade, garantindo que todos os envolvidos no sistema de saúde suplementar possam se beneficiar de uma relação mais justa e equilibrada.

 

 

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