Claudia Laselva, do Hospital Israelita Albert Einstein, compartilha inspirações de vida e analisa o cenário atual da saúde brasileira
Durante sua trajetória no ramo da enfermagem, Cláudia Laselva enfrentou diversos desafios, começando pelos obstáculos pessoais. “É uma luta constante para ajustar as prioridades e lidar com as responsabilidades da carreira, de ser mãe, mulher, cultivas as amizades e ter um tempo só para mim. Não é uma equação fácil.”
A atual Diretora de Operações e Enfermagem do Hospital Israelita Albert Einstein trabalha com gestão de pessoas há mais de 33 anos e adquiriu importantes ensinamentos de como ser uma boa líder. O que mais se destacou para Claudia foi a importância de um feedback transparente e assertivo, mas acolhedor.
“O feedback é a maior ferramenta de desenvolvimento de pessoas que existe. Vi transformações incríveis em profissionais da minha equipe após um bom feedback e aprendi a valorizar também os retornos recebidos como um verdadeiro presente,”
Claudia também acredita que existem duas características fundamentais para uma boa liderança: desenvolver inteligência emocional e um pensamento crítico o suficiente para trabalhar com diferentes perspectivas.
“Precisamos aprender a valorizar as pessoas e focar mais em soluções do que em problemas, aprender a reconhecer as falhas, aceitar circunstâncias que não podem ser mudadas e, especialmente, aprender a tolerar nossos próprios erros.”
Em entrevista a Healthcare, Claudia discorre sobre inspirações, realizações e o setor da enfermagem. Confira:
Inspirações de vida
“Me lembro de um episódio, na ocasião da morte de meu amado pai. Foi um momento muito triste tanto por sua perda, quanto pela falta de cuidado humanizado comigo e com ele.
Eu já era enfermeira de UTI, e ao deixa-lo naquela noite na UTI, perguntei à equipe se poderia passar a noite com ele, pois sabia da irreversibilidade do caso. A resposta foi ‘não’, então fui para casa e voltei para o hospital às 5 horas da manhã, pois queria vê-lo antes de entrar no meu plantão.
Me deixaram aguardando na recepção por mais de duas horas e, quando a médica me chamou em sua sala, foi para informar que meu pai havia acabado de falecer. Senti uma revolta enorme, pois eu estava há poucos metros de distância. Por que não me chamaram?
Depois disso, eu definitivamente fui uma enfermeira ainda mais cuidadosa com as necessidades de pacientes e seus familiares, especialmente nesse momento tão delicado. E, acima de tudo, esse episódio me fez refletir o quanto um profissional de saúde pode fazer diferença na vida dos pacientes e de seus familiares.”
Enfermagem na pandemia
“A pandemia trouxe maior visibilidade e valorização para a profissão, mostrando a importância da enfermagem na gestão. Estivemos à frente da liderança de comitês e hospitais de campanha, e isso demostrou que existem muitos enfermeiros que podem ocupar posições de destaque em instituições de saúde.
A pandemia reforçou também a ideia que é preciso investir na enfermagem, em sua formação e qualificação técnica, e no aprimoramento das habilidades de liderança.
Nesse período, pudemos solidificar a mensagem que o profissional de enfermagem pode contribuir de maneira importante para um sistema mais acessível e com a equidade na saúde, mas que, para isso, é necessário ter condições adequadas de trabalho.
O reconhecimento da nossa classe veio, mas com uma enorme fadiga emocional e física. Isso deve ser um fator de alerta para as autoridades do setor, visto que não tínhamos um número suficiente de enfermeiros qualificados para o cuidado da complexidade que envolve a Covid-19 e os profissionais tiveram que fazer cargas de trabalho exaustivas.”
Realizações
“Sob o ponto de vista de realização pessoal, ver as atitudes de minha filha, hoje com apenas 22 anos, e ter a certeza de que, independente de seu sucesso profissional ou pessoal, ela já é tudo que eu imaginei para ela: íntegra, ética e preocupada em fazer o bem a outras pessoas.
Do ponto de vista profissional, ver os resultados do enfrentamento da pandemia e o processo de retomada das operações do Einstein, me deixa realizada, principalmente ao pensar no aprendizado e reflexão trazidos.”
Futuro
“Para os próximos anos, acho que enfrentaremos um período de grandes mudanças. O foco não será mais no cuidado episódio, mas no cuidado integrado e voltado à prevenção de doenças e promoção da saúde.
Vai ser preciso atingir a redução de desperdícios na saúde, melhorar a experiência do paciente e buscar diferentes alternativas de cuidado, então devemos acompanhar a migração de serviços não emergenciais dos hospitais para ambulatórios ou modelos alternativos. Os hospitais ficarão reservados apenas à alta complexidade: cirurgias, pacientes clínicos, intensivos e emergências.
O Home Hospital e a internação de pacientes agudos de baixa complexidade em casa, que já é realidade em outros países, deve ganhar relevância no Brasil. Isso promove uma opção de cuidado com qualidade e eficiência, menores custos, redução na ocorrência de infecções e melhor experiência do paciente.
É importante salientar a mudança na expectativa dos consumidores, que estão mais interessados no bem-estar geral, melhor informados e com maior acesso a ferramentas e plataformas digitais. Em resposta à maior conectividade dos consumidores, os provedores de cuidado em saúde precisam investir em ferramentas digitais e plataformas online, como telemedicina.
Essas mudanças refletem o protagonismo do paciente e a necessidade de os provedores em saúde entenderem que pacientes são, hoje, consumidores de saúde à medida que tomam decisões e escolhem seus prestadores de cuidado.”
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