Em “O Homem que Confundiu sua Mulher com um Chapéu”, o neurologista Oliver Sacks descreve alguns distúrbios neurológicos, entre eles, a agnosia visual, quando o cérebro não reconhece objetos pela visão. Um homem com a disfunção viu um rio, quando mostradas imagens das dunas do Saara, confundiu seu próprio pé quando procurava os sapatos e agarrou a cabeça da esposa quando foi pegar seu chapéu – fato que deu nome ao livro. Outras situações e doenças são apresentadas, por exemplo, quando o cérebro identifica o objeto, mas é incapaz de encontrar seu significado (agnosia visual perceptiva).
Na área da Saúde, que figura como uma das principais preocupações dos brasileiros pelo menos desde as eleições de 2014, parece ocorrer o mesmo: os problemas são identificados (o “objeto”), mas nossos políticos não encontram sentido em resolvê-los (o “significado”). No atual debate eleitoral, após uma pandemia que expôs todas as fragilidades do SUS e realçou as desigualdades sociais, a Saúde merece – ou mereceria – mais atenção. Recentemente, o DataFolha mostrou novamente que saúde e educação são as áreas mais importantes para os eleitores na hora de definir o voto para presidente.
A sabatina que a Folha realizou com os representantes das campanhas de Lula, Ciro Gomes e Simone Tebet expôs o que os candidatos pensam sobre temas relevantes da saúde, mas evidenciou a falta de um projeto claro para o setor. Se por um lado, os participantes demonstraram conhecer os dados e conceitos atuais sobre saúde baseada em valor e centrada no paciente, por outro, não chegaram efetivamente a elencar quais passos serão dados e de que forma um novo tempo na saúde será implementado. Além disso, o atual Presidente da República e candidato, Jair Bolsonaro, sequer enviou representante.
Por entender o seu papel social e que o acesso à saúde com garantia de qualidade assistencial, equidade e sustentabilidade é um direito de qualquer cidadão, o Sindicato de Hospitais, Clínicas, Laboratórios e Estabelecimentos de Saúde do Estado de São Paulo (SindHosp) produziu um documento com dez propostas para a Saúde, que foi apresentado a todos os candidatos ao Governo do Estado de São Paulo, além de alguns candidatos ao Legislativo em ambas as instâncias. As iniciativas também são factíveis para implementação em âmbito federal.
Elaboradas de forma democrática, com a colaboração de aproximadamente cem profissionais que atuam em todo o ecossistema da saúde, tanto no setor público quanto no privado, essas propostas partem de três pontos: dar acesso ao cidadão, que esse acesso seja de qualidade e que haja sustentabilidade econômico-financeira. A saúde digital surge como uma ferramenta estratégica que pode levar o sistema de saúde a um novo patamar de desenvolvimento, não só de inclusão assistencial, como também um instrumento de qualificação da informação e da gestão. Ela também pode impulsionar a adesão às propostas e facilitar sua implementação e acompanhamento.
O fortalecimento da atenção primária e sua integração com serviços de média e alta complexidade, formação e capacitação dos profissionais de saúde, maior interação entre os setores público e privado, a interoperabilidade de dados, financiamento e novas formas de custeio e remuneração e incentivo à inovação são algumas das propostas apresentadas.
Estamos próximos de escolher os que irão traçar o destino do País e dos Estados nos próximos anos. Os desafios da Saúde são, também, oportunidades que devem ser aproveitadas, pois trata-se de um setor que está diretamente ligado ao desenvolvimento econômico e social. Que o eleitor vote de forma consciente e analise as propostas de cada candidato, para que a Saúde saia definitivamente da lista das principais preocupações. É desejo de toda a sociedade que os eleitos consigam implementar políticas públicas que façam do Brasil um país mais saudável, mais justo e que garanta mais dignidade à vida das pessoas.