Estudo brasileiro realizado com mais de 100 mil pacientes em início de terapia antirretroviral comprovou a maior efetividade do medicamento dolutegravir (DTG) para o tratamento do HIV quando comparado a outros antirretrovirais. Os resultados da pesquisa foram apresentados nesta terça-feira, (24/7), na 22ª Conferência Internacional de Aids, o mais importante encontro sobre HIV/aids do mundo, que acontece em Amsterdã (Holanda), até 27 julho.
A pesquisa utilizou uma das maiores coortes de vida real sobre o uso do DTG do mundo. Foram coletados e analisados dados de 103.240 pacientes em início de terapia antirretroviral, com 15 anos ou mais, e que iniciaram o tratamento entre janeiro de 2014 e junho de 2017. Os dados foram fornecidos por dois sistemas de informação em saúde do SUS, que controlam a dispensação dos medicamentos para o HIV e os exames utilizados para monitorar a infecção (CD4 e carga viral).
Estudos desse tipo têm sido muito utilizados na tomada de decisão sobre novos medicamentos, pois são conduzidos em ambiente do mundo real, cujas populações participantes são muito mais representativas da realidade do que aquelas selecionadas para ensaios clínicos, sendo estes realizados em ambientes controlados e com critérios mais rigorosos de inclusão de pacientes.
Os resultados do estudo demonstram que o esquema de tratamento com DTG, associado ao “2 em 1” (tenofovir e lamivudina), foi 42% mais eficaz na supressão da carga viral do HIV, em um período de seis meses, quando comparado ao “3 em 1” (combinação dos antirretrovirais efavirenz, tenofovir e lamivudina), que era o esquema de primeira linha recomendado anteriormente ao dolutegravir. Já em comparação a outros esquemas, o dolutegravir + “2 em 1” foi 51% a 162% mais efetivo.
A terapia antirretroviral diminui significativamente a quantidade de HIV no sangue, suprimindo a carga viral a níveis indetectáveis. Atingir e manter a carga viral indetectável, além de trazer inúmeros benefícios para a saúde da pessoa vivendo com HIV, reduz a quase zero o risco de transmissão do vírus por via sexual. Por isso, os resultados do estudo são ainda mais animadores para a resposta brasileira ao HIV.
“Os resultados que encontramos apóiam a decisão do Brasil de mudar seus protocolos de tratamento clínico, recomendando o dolutegravir como esquema preferencial para terapia antirretroviral de primeira linha, em substituição aos esquemas com efavirenz”, ressaltou Mariana Veloso, uma das pesquisadoras envolvidas no estudo.
O Dolutegravir (DTG) é utilizado no Brasil para pacientes iniciantes no tratamento do HIV desde janeiro de 2017. Mais recentemente, foi incluída, nos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDT) do HIV, a recomendação de mudança para o DTG nos esquemas de tratamento de terceira linha com raltegravir e naqueles em que o paciente apresente eventos adversos e toxicidades indesejáveis.
“É importante observar que essa recomendação é baseada na escolha da pessoa, respeitando sua vontade de mudar. Além disso, pessoas coinfectadas com tuberculose e mulheres grávidas ou que pretendam engravidar não devem usar o dolutegravir”, explica a diretora do Departamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções Sexualmente Transmissíveis, do HIV/Aids e das Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Adele Benzaken.
Atualmente, no Brasil, 76.713 pessoas utilizam o DTG como primeira linha e outros 45.645 mudaram para o DTG. Somados, são mais de 122 mil brasileiros vivendo com HIV utilizando o dolutegravir em seus esquemas de tratamento antirretroviral, número que representa 19% do total de 572 mil brasileiros recebendo tratamento antirretroviral de forma gratuita por meio do SUS. Destaca-se também que 87% das pessoas que iniciaram o tratamento em 2018 começaram com DTG.
Barreiras contra o vírus HIV
Os antirretrovirais são medicamentos usados no tratamento do HIV que atuam no sistema imunológico, bloqueando as diferentes fases do ciclo de multiplicação do vírus no corpo. O dolutegravir faz parte de uma nova classe de antirretrovirais do tipo dos inibidores de integrase, que atuam impedindo que o código genético do HIV se integre à célula humana, impossibilitando assim sua multiplicação.
As outras classes mais comuns de antirretrovirais são: os inibidores de protease, que atuam nessa enzima, bloqueando sua ação e impedindo a produção de novas cópias de células infectadas com HIV; e os inibidores nucleosídeos e os não nucleosídeos da transcriptase reversa, que atuam sobre a enzima transcriptase reversa, impedindo que o vírus se reproduza. Os do tipo núcleosídeo agem tornando defeituosa a cadeia de DNA que o HIV cria dentro das células de defesa do organismo; já os não nucleosídeos bloqueiam diretamente a ação da enzima.