Em um cenário marcado por incertezas econômicas e desafios em toda a cadeia produtiva do setor, a indústria de tecnologia para saúde no Brasil se prepara para um futuro de estabilidade restrita, tendendo a queda, mas com muitos obstáculos a serem superados para que isso ocorra. Fernando Silveira Filho, presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde (ABIMED), faz uma análise das tendências para o setor, com ênfase em fatores econômicos, investimentos e políticas públicas.
Fernando acredita que o setor passará por um ano de “estabilidade”, mantendo os patamares observados em 2023 e 2024, quando o mercado se reposicionou após o pico da retomada pós-pandemia. “A liquidez no mercado ainda é um problema. A retenção de pagamentos e outras condições impostas pelos planos de saúde estão criando uma crise de liquidez, o que compromete o fluxo de recursos”, afirma. A alta taxa de juros e a de câmbio, que, apesar de um pequeno alívio, continuam elevadas, impactam a capacidade de investimento, o capital de giro e o aumento sensível dos custos logísticos e dos produtos em si.
Esse cenário de incerteza econômica, somado às dificuldades globais, sugere que 2025 será um ano muito sensível do ponto de vista econômico e financeiro. “O consumo aparente deve seguir o de 2024, implicando estabilidade e movimentação econômico-financeira contida”, pontua Fernando.
O impacto da alta taxa de juros no mercado de investimentos também preocupa. O setor de equipamentos médicos enfrenta uma retração nos investimentos, especialmente os internacionais, devido à cautela dos investidores. Fernando explica que, apesar do câmbio favorável para investir no país, o Brasil ainda sofre com problemas de custo e insegurança jurídica. Esses fatores tornam o país um ambiente menos atrativo para novos investimentos em tecnologia.
O movimento contido em investimentos é outro fator que impacta o avanço tecnológico do setor. O Brasil ainda enfrenta um “gap tecnológico” de cerca de oito anos em relação às potências industriais do setor. Embora esse gap não deva aumentar em 2025, a contenção de investimentos retarda o processo de redução dessa distância. “Embora o setor de pesquisa e desenvolvimento no Brasil seja forte, os investimentos têm sido pontuais e as perspectivas de aceleração da inovação são moderadas quando comparadas a outros países da América Latina”, avalia.
Por outro lado, o governo brasileiro tem implementado algumas políticas para tentar impulsionar o setor. A política pública voltada para o Complexo Econômico e Industrial da Saúde tem gerado algumas discussões sobre o incentivo a novos investimentos, especialmente no que diz respeito ao Programa de Desenvolvimento Produtivo (PDP). Contudo, Fernando é cético quanto à eficácia do PDP para o setor de dispositivos médicos, afirmando que o programa tem maior aderência para a indústria farmacêutica e que seria necessário um foco maior na atração de empresas de tecnologia de ponta para reduzir o gap tecnológico, além de novos componentes de atratividade para as líderes globais e, sensível redução do Custo Brasil e da insegurança jurídica. O interesse no país é grande, mas temos que criar as condições para que esse interesse se materialize de forma efetiva.
Ainda no âmbito das políticas públicas, ele destaca o impacto da reforma tributária sancionada em 2024. Embora a ABIMED tenha participado ativamente das discussões sobre a reforma, a expectativa do setor era de uma redução mais significativa de tributos. No entanto, o texto aprovado não trouxe grandes avanços sobre os equipamentos médicos. “A reforma foi positiva em termos gerais, mas não podemos aceitar que as reduções previstas na Emenda Constitucional não tenham sido aplicadas de forma ampla ao setor, de forma isonômica a outro setor da indústria. Uma quantidade expressiva de produtos exposta a uma carga tributária maior sem dúvida irá afetar toda a cadeia da saúde”, explica.
O cenário de fusões e aquisições também está no radar da ABIMED. Segundo o presidente da Associação, o setor de dispositivos médicos está inserido em um movimento de integração mais amplo da cadeia de saúde. No entanto, o entendimento da entidade é que as integrações verticais entre prestadores de serviços e pagadores, e eventuais fusões naquele setor não resolverão os problemas estruturais da saúde: “esse movimento visa otimizar processos e custos, mas não mudará a realidade da saúde no Brasil”.
Além disso, o setor se depara com um ambiente jurídico instável, com questões sendo debatidas no Congresso Nacional. A reformulação da política fiscal e o impacto de novos projetos de lei, como a regulamentação da inteligência artificial e as discussões em torno da potencial criação de uma agência única de saúde, são pontos de atenção para o futuro.
Fernando conclui que 2025 será um ano de desafios, mas também de oportunidades de adaptação. O setor de dispositivos médicos e a área da Saúde de forma ampla precisam encontrar um grau de alinhamento e entendimento de que os cenários global e interno demandam propostas inovadoras para o setor da Saúde para garantir sua sustentabilidade e crescimento, mas acima de tudo garantir acesso amplo a serviços, produtos e tecnologias adequadas a toda a população brasileira.
Leia esta e outras matérias na revista Healthcare Management edição 97.
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