A Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa – Interfarma vê com preocupação a decisão do governador João Doria de reduzir benefícios fiscais de ICMS concedidos pelo Estado de São Paulo. A minirreforma tributária paulista, que passou a vigorar agora em janeiro, terá como consequência um aumento de preços de medicamentos e de equipamentos médico- hospitalares em um período em que o Brasil enfrenta uma crise sanitária e vive um momento de debilidade socioeconômica, sem precedentes na história recente.
No dia 16 de outubro de 2020, foi publicada a Lei nº 17.293/2020, que estabelece medidas voltadas ao ajuste fiscal e ao equilíbrio das contas públicas, a qual, dentre outras medidas, autorizou o Poder Executivo paulista a reduzir benefícios fiscais de ICMS concedidos pelo Estado de São Paulo. Na mesma data, os Decretos n os 65.254/2020 e 65.255/2020 impuseram condições para a concessão de determinadas isenções de ICMS ao setor farmacêutico, que representaram, na prática, a supressão da desoneração para determinadas operações.
Com isso, as isenções de ICMS aplicáveis a medicamentos utilizados no tratamento de enfermidades graves (câncer, leucemia, hepatite B, osteoporose, artrite reumatoide, acidente vascular cerebral, infarto agudo do miocárdio etc.) e de uso continuado, antes extensivas a todas as operações praticadas neste Estado, passaram a se limitar às operações com hospitais públicos federais, estaduais ou municipais e com Santas Casas.
Desde a publicação dos Decretos em questão, a INTERFARMA tem optado pelas discussões administrativas com o Governo do Estado de São Paulo, com o objetivo de demonstrar a impropriedade destas medidas e suas nefastas consequências, com vistas a demovê-lo da ideia de promover qualquer aumento de carga tributária sobre medicamentos.
No dia 6 de janeiro, o Governo paulista anunciou o cancelamento do corte de alguns benefícios fiscais do pacote fiscal, entre eles, dos medicamentos genéricos. Reiteramos que revogar o aumento do ICMS apenas para esses medicamentos não trará melhoria para os pacientes. Apesar de um discurso político de impacto, os aumentos propostos para genéricos comparativamente a outros medicamentos são de magnitudes totalmente diferentes. Revogar o aumento dos medicamentos genéricos de 13,2% para 12% não terá impacto nas contas públicas. Para os outros medicamentos citados anteriormente, o aumento proposto é da ordem de 22%. Por isso, o Governo do Estado de São Paulo aceitou revogar apenas para genéricos e não para outros medicamentos, o que não beneficia os pacientes de outras doenças crônicas e de alta complexidade em um momento tão crítico da saúde pública do País.
Diante dessa decisão, os preços destes medicamentos de enfermidades graves quando destinados ao Sistema Privado de Saúde deverão sofrer aumento de ZERO para aproximadamente 22% (cálculo feito pela alíquota padrão de ICMS/SP de 18%) com severos impactos para os pacientes que deles necessitam. Não podemos desconsiderar ainda a pressão sobre a saúde suplementar e privada, já que a isenção será limitada às operações com hospitais públicos federais, estaduais ou municipais e com Santas Casas. O setor farmacêutico é regulado nos termos da Lei nº 10.742/2003, que definiu normas para promover assistência farmacêutica à população, por meio de mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos e a competitividade do setor. Para isso, foi criada a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos – CMED que tem entre suas competências estabelecer critérios para fixação e ajuste de preços, assegurando o efetivo repasse aos preços dos medicamentos de qualquer alteração da carga tributária (Art. 6º, X da Lei nº 10.742/2003). Ou seja, esse aumento de ICMS pode ser repassado automaticamente para os preços de medicamentos no Estado de São Paulo, onerando o orçamento das famílias em um momento de pandemia, crise econômica e alta na taxa de desemprego.
A INTERFARMA ressalta que tal decisão trará ainda outras consequências, como:
Parcela relevante dos pacientes em tratamento de doenças alcançadas pelas referidas isenções é atendida por planos de saúde. Neste sentido, com a maior tributação destes medicamentos haverá, inevitavelmente, aumento de sinistralidade e consequente reajuste das mensalidades dos planos, cujos beneficiários arcarão com custos ainda mais elevados;
A rede privada de saúde (hospitais, clínicas etc.) é responsável pelo atendimento de grande parcela de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), cujos custos também serão afetados pelo aumento de carga tributária em comento, na medida em que passará a comprar medicamentos utilizados no tratamento de enfermidades graves e de uso continuado por valores majorados em até 22%, no Estado de São Paulo;
Normas tributárias relacionadas a isenções, nos termos do Código Tributário Nacional (Art. 111, II), devem ser interpretadas de forma literal. E, neste aspecto, as condições impostas pelo Governo Paulista também deixaram de fora das isenções em causa a comercialização de muitos destes produtos ao Ministério da Saúde ou às Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde;
É demasiadamente sabido que o Estado de São Paulo representa o principal polo de saúde privada do país, atraindo pacientes de diversas Unidades Federadas e até do exterior. A maior tributação de medicamentos em território paulista colocará este Estado em condições desfavoráveis de competitividade em relação ao atendimento promovido em outros Estados. Ou seja, o tratamento de saúde em território paulista ficará mais oneroso do que aqueles realizados em outros locais do país, com reflexos negativos em toda a cadeia de saúde paulista.
Vale salientar ainda que as operações com medicamentos no Estado estão submetidas ao regime de substituição tributária, através do qual se concentra no industrial/importador (primeiro elo da cadeia) a tributação de ICMS devida por toda a cadeia econômica. Porém, de maneira geral, as operações de venda de medicamentos não ocorrem diretamente do estabelecimento fabricante para os hospitais, clínicas, planos de saúde e afins (consumidores finais). Ou seja, a comercialização desses produtos é realizada por meio de estabelecimentos distribuidores. Como o destino das mercadorias normalmente é desconhecido quando se realizam as operações entre fabricantes e distribuidores, até mesmo os produtos farmacêuticos cujo destino venha a ser o Sistema Público de Saúde poderão sofrer tributação de ICMS neste primeiro elo da cadeia.
É impensável ocorrer um aumento de carga tributária do tributo de maior arrecadação nacional, o ICMS, em relação a produtos tão sensíveis à saúde da população brasileira em momento tão delicado como o que o País está enfrentando. A sociedade brasileira e o setor produtivo nacional precisam de incentivos para a retomada das atividades econômicas, incapazes de suportar qualquer aumento de carga tributária.
A Interfarma reforça seu posicionamento quanto a necessidade de reverter essa medida tributária, de imediato, evitando assim a supressão das isenções de ICMS concedidas a todo e qualquer insumo, seja medicamento ou device utilizados no tratamento de enfermidades graves e de uso continuado, já mencionadas.
Promover medidas de ajuste fiscal às custas da população paulista, ainda bastante carente de saúde de qualidade é medida, no mínimo, inadequada sob qualquer aspecto.