A saúde é um setor que interage com vários outros. Políticas públicas eficientes voltadas à educação, infraestrutura (como saneamento básico), meio ambiente, segurança pública e outras áreas impactam positivamente os indicadores sociais e também os de saúde. Um problema que precisa ser combatido com urgência e que causa perdas imensas, tanto econômicas como sociais, são os altos índices de acidentes de transporte registrados no país. Somos o quarto trânsito mais violento das Américas, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).
Apesar da rigidez das infrações, dados do DPVAT, seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores terrestres, mostram que 41.151 pessoas morreram vítimas de acidentes no país em 2017. Os óbitos representam um aumento de 23% em relação a 2016, apesar da queda de quase 50% no número total de acidentes nos últimos três anos.
O custo disso para o Brasil é de aproximadamente 3% do Produto Interno Bruto, ou R$ 200 bilhões, já que 90,5% das vítimas estavam em idade economicamente ativa. O cálculo é do Centro de Pesquisa e Economia do Seguro.
Mesmo correspondendo a apenas 27% da frota nacional de veículos, os acidentes com moto representam 74% do total. Em 2017, mais de 50% deles deixaram sequelas permanentes, em um grupo formado majoritariamente por homens entre 18 e 34 anos. Nordeste e Centro-Oeste registraram aumento de 30% no número de casos com vítimas ou invalidez permanente, de 2016 para 2017. Em São Paulo, o crescimento foi de 20%. Estamos, portanto, diante de um grave problema de saúde pública, principalmente porque os acidentes de trânsito não estão entre as causas inevitáveis de saúde, como o aumento das doenças crônico-degenerativas, causado, entre outros fatores, pelo envelhecimento da população. Os acidentes são evitáveis, podem ser prevenidos.
Nos últimos oito anos, a circulação de motos cresceu 40% no país, sem que isso fosse acompanhado de políticas públicas voltadas a esse público. A relação é de uma motocicleta para cada dez brasileiros e sete mortes para cada cem mil pessoas, o que coloca o Brasil na segunda maior taxa de óbitos por habitante em acidentes de moto, segundo o Banco Mundial. Algumas medidas podem e devem ser tomadas imediatamente. Ruas e avenidas do país não estão preparadas para absorver esse contingente de motos e a sinalização é falha. A educação dos condutores precisa ter início no processo de habilitação, que também é deficiente, pois não contempla experiência de direção em vias públicas, por exemplo. A fiscalização é ineficaz, o que estimula parte dos condutores a dirigir sem habilitação e equipamentos de segurança. Essas ações precisam ocorrer simultaneamente, dentro de uma política pública nacional, para tentar reverter a atual realidade.
O tema é tão preocupante que as Nações Unidas, com base em estudo da OMS, definiram 2011 a 2020 como a “Década de ações para a segurança no trânsito”. Atualmente, esses acidentes são a nona maior causa de mortes no mundo e podem saltar para o quinto lugar até 2030, com 2,4 milhões de mortes, se nada for feito. Apesar de o Brasil ter abraçado a campanha, os números nacionais mostram que estamos prestes a perder mais essa batalha. O tema é sério e carece de políticas públicas que garantam planejamento e um maior investimento em educação no trânsito, fiscalização e segurança das vias.
Médico nefrologista e presidente da Federação e do Sindicato dos Hospitais, Cínicas e Laboratórios do Estado de São Paulo (FEHOESP e SINDHOSP)