Instabilidades do setor oneraram em R$ 1,6 bilhão procedimentos de saúde, o que deve agravar situação financeira na saúde suplementar; presidente da ANAB analisa números do setor
Mais de 50,7 milhões de pessoas possuem um plano de saúde em junho de 2023. É o que indica balanço mensal divulgado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
O número representa um novo pico, após uma sequência de recordes na margem de crescimento que vem se repetindo nos últimos meses.
No período, foram identificados 50.763.871 de beneficiários em planos de assistência médica. Neste mesmo recorte, o relatório indica também crescimento correspondente a 2,23% em relação ao mesmo mês do ano anterior.
Os números aparecem em um momento de transformações profundas no setor, marcado pela discussão envolvendo as fraudes nos planos de saúde, novas regras para substituição de hospitais nas redes credenciadas e o amplo aumento do pagamento de reembolsos que vem crescendo desde 2019.
Todas essas mudanças oneraram ao setor cerca de R$1,6 bilhão em procedimentos (consultas, exames, terapias, cirurgias e internações) apenas em 2022, segundo Panorama de Saúde Suplementar da ANS.
As operadoras de planos de saúde também tiveram um prejuízo de cerca de R$10,7 bilhões em 2022, de acordo com relatório da ANS. O maior prejuízo da saúde suplementar em 20 anos. Entre 2021 e 2022, as receitas dos planos de saúde cresceram 5,6%, enquanto as despesas aumentaram 11,1%.
“Uma conta que não fecha e sinaliza para um cenário de altos índices de reajustes. Há um claro sinal de instabilidade do setor gerado pelo resultado financeiro das operadoras e pelo rol exemplificativo, sendo que, este último, deve acarretar num aumento ainda maior do preço para novos planos de saúde e no desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos vigentes”, indica Alessandro Acayaba de Toledo, presidente da Associação Nacional das Administradoras de Benefícios (ANAB) e advogado especialista em Direito e Saúde.
Além disso, as expectativas do setor com a votação do projeto de lei 7.419/2006, que tramita em regime de urgência na Câmara dos Deputados, não são as melhores. As propostas que estão sendo estudadas apontam para uma tendência extremamente pró-consumidor, sem medir as consequências adversas das promessas populistas.
A ANAB reforça que os reajustes anuais dos planos coletivos são extremamente necessários para a manutenção do sistema de saúde suplementar brasileiro em equilíbrio, apoiando iniciativas para o aperfeiçoamento e transparência dos cálculos, precedidas de amplo debate técnico.
Os índices praticados pelas operadoras de saúde em 2023 refletem o cenário do setor, que enfrenta uma série de instabilidades por diversos fatores: adoção do rol exemplificativo, que incrementa coberturas inesperadas e acarreta no desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos vigentes; aumento das fraudes no uso de planos; obrigatoriedade de fornecimento de medicamentos de alto custo; maior sinistralidade dos últimos anos (chegando a 100% em alguns contratos); entre outros.
Como consequência direta, as operadoras de planos de saúde tiveram um prejuízo operacional de cerca de R$10,7 bilhões em 2022 e isso reflete nos índices de reajuste dos planos de saúde coletivos, que estão sendo anunciados em cada contrato ao longo deste ano.
“As nossas associadas atuaram para negociar com as operadoras reajustes de menor impacto possível para os beneficiários que possuem planos sob sua gestão. No último ano, o percentual médio de reajuste de planos de saúde coletivos pedido pelas operadoras foi de 44%, enquanto que a média aplicada em contratos com a participação de administradoras de benefícios foi de 20%, em 2022; ou seja, foi possível gerar uma economia de R$ 2 bilhões para os consumidores, que é a diferença entre o pedido pelas operadoras e o percentual efetivamente aplicado. De 2013 a 2023, essa economia gerada nos contratos geridos por administradoras de benefícios passou de R$8,6 bilhões”, destaca o presidente da ANAB, Alessandro Acayaba de Toledo.
Plano de saúde é prioridade para o brasileiro
A Pesquisa ANAB de Planos de Saúde – feita em parceria com o Instituto Bateiah Estratégia e Reputação – já mostrava que os consumidores enxergam o plano de saúde como uma conquista, tal qual ter um imóvel, um veículo, realizar uma viagem ou ter investimentos. O plano é a terceira maior conquista do brasileiro, de acordo com esse levantamento.
Na faixa etária acima de 50 anos, o benefício só perde para a casa própria em importância. Quanto menor a renda familiar e o grau de escolaridade, maior é o reconhecimento do plano.
É na parcela da população aposentada que o plano assume papel principal e toma a frente no ranking das conquistas dos brasileiros, deixando casa própria e automóvel para trás. Ao menos 50,6% dos entrevistados aposentados indicam o plano como conquista.
“Enquanto o número de novos beneficiários cresce, vemos também uma parcela de pessoas que buscam uma solução para manter o plano, especialmente em virtude do preço”, destaca Alessandro Acayaba de Toledo.
Novos produtos para acomodar nas contas do brasileiro
Pesquisa da ANAB mostrou que 47,5% dos entrevistados tiveram que ajustar o orçamento recentemente para não perder o plano de saúde. O estudo revelou ainda que 83% das pessoas têm medo de perder o benefício.
“Ainda que não queiram perder o benefício, por entender que o plano representa uma segurança, os ajustes nas contas das famílias precisarão de atenção este ano para fazer caber a mensalidade. Por entender que o plano de saúde é uma prioridade para o brasileiro, estamos auxiliando os beneficiários nos seus cálculos e, quando não puderem arcar com o reajuste, optarem por alternativas muito próximas ao produto que já dispunham, exercendo a vantagem da portabilidade de carências. As administradoras de benefícios criaram, nos últimos anos, mais de 50 novos produtos para acomodar seus consumidores”, afirma o presidente da ANAB.
O mercado de operadoras de planos de saúde também destaca mudanças recentes que estão impactando os cálculos de reajuste como a adoção do rol exemplificativo e novo piso da enfermagem.
“A incorporação do remédio Zolgensma – considerado o mais caro do mundo (R$6,5 milhões) – em fevereiro deste ano, por exemplo, compromete a estabilidade das operadoras e, por consequência, esse valor acaba sendo repassado em forma de reajuste, mesmo para quem não teve acesso ao medicamento”, explica Acayaba de Toledo.