A população brasileira está envelhecendo. A última PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), divulgada pelo IBGE, aponta que as pessoas com 50 anos ou mais já correspondem a 15% da população total. Dez anos antes, esse grupo representava pouco mais de 11%.
Isso se deve, em parte, ao aumento consistente na expectativa de vida ao longo das últimas décadas. Desde os anos 1960, esse índice subiu cerca de 40%. O brasileiro nascido hoje viverá, em média, até os 77 anos. Ademais, com a simultânea queda no número de filhos por família, a faixa da população acima dos 60 anos é, proporcionalmente, a que mais cresce no país.
O Brasil tem hoje 30 milhões de idosos. Estima-se que até 2050 esse número irá dobrar. Estamos vivendo mais e com mais saúde, o que implica em novos desafios, sobretudo do ponto de vista do poder público e da infraestrutura das cidades, mas também em novas oportunidades.
O leitor(a) talvez já tenha ouvido a expressão “economia prateada”, ou silver economy, em inglês. O termo brinca com o “prateado” dos cabelos grisalhos para se referir aos produtos e serviços voltados especificamente ao público mais velho.
O setor já movimenta algo como R$ 1,7 trilhões no Brasil. Até o final desta década, o montante deve chegar a R$ 3 trilhões. Trata-se, afinal, de um mercado potencial que engloba um quarto da população, ou 55 milhões de consumidores (número de brasileiros com mais de 50 anos).
É nesse contexto que devemos enxergar o fenômeno recente das seniortechs ou agetechs, isto é, das startups voltadas ao público mais maduro. São empresas pioneiras, disruptivas, que desenvolvem aplicativos e plataformas que atendem às mais variadas demandas da população idosa, de educação financeira e prevenção de golpes até moda e beleza, passando por reinserção no mercado de trabalho e educação continuada.
Mas o que exatamente isso tem a ver com saúde? Várias dessas seniortechs dedicam-se especificamente à promoção do bem-estar na terceira idade, com serviços pontuais, como é o caso dos apps que auxiliam no uso de medicamentos, ou mais amplos, com plataformas que monitoram exercícios físicos ou cujo conteúdo estimula o aprendizado e o raciocínio, ajudando a preservar, portanto, a saúde mental.
Nesse sentido, as seniortechs podem ser importantes aliadas no contexto de uma política de saúde direcionada à população mais velha.
Por isso o InovaHC, centro de inovação tecnológica e empreendedorismo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, e a empresa de consultoria Ativen elaboraram o primeiro Mapa das Seniortechs do Brasil (https://www.ativen.com.br/mapa-seniortechs/).
Pela primeira vez temos um panorama atualizado e interativo das seniortechs brasileiras. Com isso, espera-se facilitar a jornada desse público que, como dito, é o que mais cresce no país. A plataforma também serve de referência para estudantes, profissionais de saúde, empreendedores e demais interessados no mercado 50+ brasileiro.
As seniortechs representadas no Mapa foram divididas em seis categorias, correspondentes aos principais desafios dessa faixa etária: “Engajamento e propósito” (empresas voltadas à educação e qualificação profissional de idosos), “Saúde”, “Cuidado”, “Vida diária e estilo de vida”, “Mobilidade” e “Paliação e finitude”.
A elaboração do Mapa – ou, mais amplamente, o próprio crescimento do mercado de seniortechs – são indícios claros de que aquele estereótipo do idoso pouco familiarizado com a tecnologia, incapaz de usar com desenvoltura um smartphone, está ultrapassado.
Nos últimos anos, sobretudo com o efeito da pandemia, a população mais velha vem se digitalizando. A PNAD Contínua indicou que em 2022 quase 58% das pessoas com mais de 60 anos são usuárias frequentes da internet. Foi a primeira vez que os idosos conectados apareceram como maioria em uma pesquisa do IBGE.
As lições que ficam para nós, profissionais da saúde, são claras. Em primeiro lugar, as seniortechs oferecem oportunidades que não podem ser desperdiçadas de melhorar a eficiência, a constância e a qualidade do atendimento à população mais velha. Ademais, é urgente compreendermos, enquanto sociedade e gestores, que cuidar da saúde dos idosos nos dias atuais é, também, garantir seu acesso à tecnologia digital.
Médico, presidente do Conselho do Instituto de Radiologia (InRad) e presidente do Conselho de Inovação (InovaHC), ambos do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, e presidente do Instituto Coalizão Saúde (ICOS).