Prática é considerada abusiva e compromete o fornecimento de produtos
Uma sondagem realizada pela Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde (ABRAIDI) com empresas associadas alerta para distorções no setor que comprometem o fluxo de caixa das empresas, provoca o fechamento de algumas e pode resultar até em desabastecimento de produtos.
O principal problema apontado pelo levantamento é a retenção de faturamento praticada por hospitais e planos de saúde. Ou seja, as distribuidoras entregam os produtos mas não recebem o pagamento no prazo acordado.
“Infelizmente essa situação virou uma prática de mercado, mas é ilegal. Hospitais e operadoras de planos de saúde não pagam as distribuidoras no vencimento acordado e essas, por sua vez, sofrem com a falta de dinheiro em caixa. Esse abuso de poder econômico prejudica muito os distribuidores e as consequências vão desde o fechamento de empresas e a falta de produtos no mercado, até o encarecimento da operação toda, afetando diretamente o consumidor final”, explica o advogado Gustavo Afonso Martins, do Wilhelm & Niels Advogados Associados.
Por precisarem vender e pelo temor de serem descredenciadas, as distribuidoras brasileiras vêm amargando essa situação, muitas vezes até sem recorrer à justiça.
“Boa parte dos produtos comercializados são importados. Próteses, instrumentais cirúrgicos, parafusos e tecnologias de ponta são adquiridas pelas distribuidoras em dólar, por meio de operações que exigem compra mínima e pagamento de impostos. São diversos custos e riscos embutidos em uma operação de compra e venda”, afirma Martins.
Segundo o levantamento, os atrasos comprometem grande parte do faturamento/mês das empresas fornecedoras. Para 40% os pagamentos superam os 121 dias.
“A exploração no segmento de saúde tem revelado comportamentos oportunistas, e com abuso de poder econômico, por parte daqueles que realizam retenções indevidas de valores faturados pelas empresas distribuidoras de produtos para saúde, além do potencial prejuízo aos consumidores”, alerta o advogado.
Com 12 anos de atuação no mercado de OPME (Órteses, Próteses, e Materiais Especiais), um empresário paranaense, que prefere não se identificar, disse que essa prática adotada por hospitais e planos de saúde prejudica muito as distribuidoras.
“Toda empresa aplica sua margem de lucro baseada no custo e pensando na liquidez em um prazo saudável, mas as operadoras e os hospitais retêm esses valores. Essa é uma prática nacional e que envolve instituições de saúde privadas e públicas de todo o país.”
Na opinião do empresário, o que predomina é a lei do mais forte.
“Eles querem comprar pelo preço mais barato e ainda pagar com muito atraso. Já registramos casos de pagamento em 180 dias, quando não deveriam passar de 90. Temos um cliente, que é um hospital que atende pelo SUS, que não paga há dois anos, mas não podemos parar de fornecer. Essas vendas com atraso no pagamento representam até 80% do nosso faturamento”, lamenta.
O advogado Gustavo Afonso Martins conta que na maioria das execuções de cobrança o devedor chama para o acordo e procura liquidar a dívida.
“O problema é que as distribuidoras evitam fazer isso por medo de represália. Por isso essa denúncia da ABRAIDI é tão importante. Ela é fruto de anos de reclamação do setor e, com certeza, um importante passo para que essa situação seja resolvida.”
A falência de muitas distribuidoras, em consequência desse atraso nos pagamentos, resulta na falta de competitividade no mercado.
“As grandes distribuidoras conseguem absorver o prejuízo e se manter no mercado, enquanto as pequenas dificilmente sobreviverão. Isso afeta o mercado, que é tutelado pela Lei 12.529/11, que defende a livre concorrência. Se a concorrência diminui, quem sofre é o consumidor, que acaba pagando mais caro por esses produtos.”