“O poder de compra do Estado para ampliar e qualificar a saúde pública”, por Fernando Silveira da ABIMED

Estudo da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), realizado em 2021, mostra que, nos 32 anos desde a regulamentação do SUS (Sistema Único de Saúde), o saldo é bastante positivo no Brasil em termos de melhoria no atendimento e na cobertura universal. A ressalva, porém, refere-se ao fato de os recursos para o setor ainda estarem abaixo do volume adequado.

Uma recomendação pertinente do relatório é no sentido de que se deve buscar mais igualdade nos serviços de alta qualidade, pois a assistência de grande parte da população tem sido assimétrica em relação aos grupos socioeconômicos, em desfavor dos mais pobres. Há, ainda, deficiências em regiões mais remotas, resultando em lacunas importantes a serem suprimidas.

Um dos principais fatores para ampliar o financiamento do setor e o grau de excelência e abrangência geográfica no atendimento do SUS é o uso inteligente do poder de compra do Estado. O aporte de recursos deve estimular a inovação e a economia de escala e considerar o escopo das empresas presentes no Brasil. Com isso, seria assegurado o fornecimento, a preços e custos compatíveis, fomentando-se a isonomia competitiva para os dispositivos médicos, essenciais para os objetivos de ampliação e qualificação do atendimento.

O orçamento federal para o sistema médico-hospitalar foi de R$ 189,4 bilhões em 2021. Em São Paulo, por exemplo, a lei orçamentária destinou R$ 23,7 bilhões à Secretaria da Saúde. Conceitualmente, quando se fala no poder e na capacidade de compra do Estado, englobam-se, também, os entes subnacionais. Não há dúvida quanto à possibilidade de utilizar essa demanda toda em favor do desenvolvimento econômico e social, para muito além da saúde, assim como se observa em políticas públicas de países avançados.

Suprir de modo mais adequado e utilizar de maneira mais inteligente as verbas do erário para as compras de dispositivos médicos resultaria, também, em menor dependência da importação, sem impedir ou obstaculizar o comércio internacional ou contrariar a lógica capitalista de melhor alocação dos recursos. Tais conceitos permaneceriam efetivos, mas a ênfase seria privilegiar a agregação de valor localmente. Como são bens essenciais e idênticos — importados ou nacionais –, ambos devem ser desonerados.

Para o melhor uso dos recursos estatais no aporte de equipamentos e tecnologia para a saúde seriam fundamentais algumas medidas: alterar a norma tributária, corrigindo a interpretação atual que impede as entidades, como as santas casas, de se manterem imunes à tributação, ao importarem diretamente ou comprarem no mercado doméstico; melhorar o sistema de pagamento do SUS; ampliar a participação proporcional do financiamento à saúde pelo Governo Federal; estabelecer critérios para atualização tempestiva da Tabela OPME (Órteses, Próteses e Materiais Especiais); e aquisição de produtos que incorporem tecnologias disruptivas.

As sugestões integram a “Proposta de Política Industrial para o Setor de Dispositivos Médicos”, elaborada pela ABIMED (Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde), ABIMO (Associação Brasileira da Indústria de Dispositivos Médicos) e ABRAIDI (Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde). O propósito é contribuir para que o presidente da República, governadores, senadores, deputados estaduais e federais a serem eleitos este ano tenham subsídios concretos para utilizar o poder de compras do Estado em favor da melhoria da saúde pública, conforme estabelece a Constituição.

* Fernando Silveira Filho é presidente-executivo da ABIMED – Associação Brasileira da Indústria de Tecnologia para Saúde.

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